sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Verdes campos

Fiz uma pequena viagem de dois dias até Kanazawa, a terra da minha amiga Misato. Nesta viagem fui conhecer uma escola básica Japonesa na qual o pai dela dá aulas e é vice-presidente.
Partimos na segunda-feira, dia 29 de Setembro, no shinkansen (comboio rápido Japonês, também apelidado pelo povo Brasileiro de "trem bala"), pelas 15h, saindo da estação de Tóquio, a maior e principal estação da cidade, e onde nunca tinha estado até então (é realmente grande, e circular pelos labirínticos caminhos cheios de pequenas lojinhas de comidas e bebidas, apinhados de gente que anda e corre de encontro às linhas dos comboios e metros, é realmente algo que nos faz sentir pequenininhos, ou, pelo menos a mim faz!). A viagem de shinkansen tornou-se para mim mais do que uma simples viagem de comboio (se bem que, mesmo aquelas que faço em Portugal, se tornam especiais porque me deixo absorver pela paisagem e me enriqueço por poder contemplá-la). Mas esta viagem foi realmente surpreendente para mim.
Já há largos anos que sonho com o Japão, quem me conhece assim há tanto tempo sabe-o bem, mas, vir para Tóquio não era exactamente o que eu tinha em mente. Não me intrepretem mal, Tóquio é incrível, mas considero-me uma 'small town girl', e o meu sonho Japonês era um mais tradicional e natural, se é que me faço entender. O que eu amo acima de tudo no Japão é a parte tradicional das pequenas aldeias em pleno contacto com a natureza; as grandes montanhas cobertas de florestas densas, e em que se escondem mosteiros recônditos; enfim, um Japão mais natural. Foi para este Japão, o do meu sonho nipónico, que este comboio bala me transportou. Mesmo a morrer de cansaço, e a debater-me com alguma sonolência, resisti adormecer até o sol se pôr no horizonte. Fui transportada para um mundo mágico de magníficas planícies de campos cultivados, com arrozais a perder de vista, rodeadas de montanhas imponentes e verdejantes; as colinas cheias de árvores frondosas e de florestas de bambus, onde se poderiam imaginar combates épicos de samurais a lutar pelos seus daimyos (os senhores feudais que os empregavam, e que foram importantes figuras no contexto político Japonês entre os séc.s X e XIX). Olhando a paisagem, admirando cada pormenor de verde e luz nos seus imensos matizes, mudando ainda que muito rapidamente, dada a grande velocidade da viagem, foi como ser transportada para um sonho de natureza rural, que me pareceu um oxímoro poder existir em simultâneo com a loucura industrial-tecnológica de Tóquio. Vislumbrei o meu sonho escassamente nesta viagem de Shinkansen, mal eu sabia que algo maior me aguardava.
Chegadas a Kanazawa, que infelizmente não pude conhecer muito, e depois de um noite de descanso merecido, a Misato e eu acordámos às 5.30h, isto porque a viagem até à escola demoraria mais de uma hora de carro. Seguimos com o pai dela, pelas ruas de Kanazawa, e depois fomos apanhar as estradas principais para fora da cidade. Depois de algum tempo a circular entre cidades que se foram tornando progressivamente mais pequenas, com menos prédios, e mais moradias, algumas já bem tradicionais, começámos a chegar à parte da viagem que me arrebataria completamente. As montanhas aproximaram-se rapidamente e, de repente, um longo túnel através da montanha foi como uma porta mágica. Abriu-se um céu azul e luminoso de sol nascente, que deu a conhecer as gigantescas montanhas cobertas de verdes magotes de árvores, de vários feitios e tamanhos, com todos os tons de verde imagináveis. De quando em quando rompendo a verdura, lá se podia perceber uma qualquer construção típica, um pequeno templo, um cemitério, quem sabe se a casa de algum senhor antigo. Apareceram também planícies cobertas de culturas agrícolas e de flores, com os carreirinhos bem alinhados, por onde os pés conhecedores de agricultores circulam, trabalhando a terra pelo seu sustento. Caminhos de montanha por onde meninas tradicionais, de quimonos pintados anseiam passear para admirar as flores e as mudanças outonais das árvores - um autêntico quadro de Kawabata (nobel Japonês de Literatura) pintou-se diante dos meus olhos, e não tenho palavras para dizer o quanto isso me marcou. Algumas vezes, a estrada circulava junto de grandes falésias, na encosta da montanha, e em baixo podiam ver-se riachos cravados de pedras, caindo depois em cascatas pelas encostas abaixo. Um universo de paisagens provenientes do cinema, da literatura e também do anime desenharam-se naturalmente na minha frente, e sendo verdade que uma imagem vale mais que mil palavras, a verdade é que não consigo imaginar que mil palavras usar para descrever aquilo que vi, senti, pensei, exprimi. Tanta coisa é assim, este blogue é nada mais do que uma tentiva frustrada desde o início de tentar combater essa inevitabilidade. Nunca poderei exprimir tudo aquilo que vivo aqui, mas espero poder exprimir algo que possa ter algum significado para alguém para além de mim.
"Verdes são os campos,
De cor do limão,
Assim são os olhos
do meu coração."
Camões

2 comentários:

alguém em algum lugar disse...

Mesmo sendo "uma tentativa frustrada" de descrever aquilo que se vive, é incrível a sensação transmitida ao leitor... Principalmente ao leitor que, tal como tu, sonha poder viajar até ao Japão para conhecer e para sentir, de perto, todas essas emoções.
Um beijinho e obrigada por partilhares connosco uma experiência absolutamente incrível.
Sara

diabitah disse...

EI!!!...

Assim não vale, eu disse que não ia ter contigo ao Japão...porque é que meteste este post tentador? Sabes que não gosto de voltar com a minha palavra atras!!!

LOL...é deliciante a forma como escrever amiguinha...

Mas fiquei curisosa com o poema de Camões...não paro de pensar de que cor são os olhos.......................................do teu amor...é isso...já não me lembrava como acabava o poema...LOL

Um bjito enorme!