quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Nikkagetsu (Dois meses)

Nikkagetsu, como o tempo voa sem parecer que se mexe tão depressa quanto gostaríamos. Como é esquisito o tempo... Voa, quando gostaríamos que ele parasse num determinado momento para o podermos aproveitar ao máximo. Depois, existem aquelas alturas em que os ponteiros parecem não querer mexer, e vão-se arrastando, preguiçosamente, pelos pontos que marcam as horas no relógio, e tudo parece demorar uma eternidade a acontecer. Realmente o tempo é difícil de compreender, mas bem, tal como dizia a célebre frase: "O tempo tem tanto tempo, quanto tempo o tempo tem", cabe a cada um de nós marcar o compasso.
O tempo tem brincado comigo. Em correrias e jogos de escondidas, umas vezes a voar velozmente pelos céus, outras vezes parado como se tivessem carregado no botão de pausa...esse malandro tem andado a fazer das suas aqui por terras de bolas e dragões.

O nosso amigo Saikyo continua nas suas eternas correrias, assim como os demais dragões seus companheiros. As bolas, essas, continuam na mesma. Sempre com pressa, sempre a andar, passando por cima de tudo e todos para serem os primeiros a chegar... a onde é que eu ainda não percebi. Que diferentes são estas bolas, todas elas fechadas nelas próprias, cada qual pensando na sua vida, de olhos bem fechados e ondulando no movimento do corpo do dragão que segue sempre, sem nunca voltar a atrás. Não tenho a certeza daquilo que procuram. Não sei se não será algo dentro delas mesmas, mas, tal como eu, o Saikyo também não me parece que saiba.

O Saikyo e eu temos falado algumas vezes. As nossas conversas são de uma dimensão estranha, não são verbais. As palavras não são capazes de descrever as nossas conversas. O Saikyo e eu comunicamos por pensamentos, é quase uma partilha de estados de espírito, que se assemelham e aglomeram num só. Pode aprender-se muito com um dragão como o Saikyo.

No país das bolas, o tempo é algo que se escapa por entre os dedos, tal e qual como uma enguia. Para mim, lidar com isso não foi particularmente mau, mas a verdade é que começava a sentir que esse tempo a esgueirar-se me era precioso e me fazia falta. Então, um dia, durante as minhas conversas de pensamentos com o Saikyo, ele ofereceu-se para me ajudar a conhecer novas realidades ainda que o tempo possa querer fugir. Desde então, o Saikyo e eu temos feito muitas viagens, mas nem todas elas físicas - em boa verdade, essas são as menos interessantes de todas as que fazemos.

Com o Saikyo, de mão dada, sigo para mundos que são completamente diferentes daquele em que vivo todos os dias. Tal como o dragão da História Interminável (Never Ending Story) que via quando era pequena, também o Saikyo me transporta para uma dimensão diferente. Um mundo feito de sons que nos enchem os ouvidos; de letras que se juntam para formar palavras; de palavras que se juntam em frases; numa combinação coordenada que nunca mais acaba. Durante as minhas viagens aprendo muito. Aprendo coisas novas que não conhecia antes, vejo locais que nunca tinha visto, mas o mais importante são as coisas que aprendo sobre mim.

Em breve poderei contar algumas das minhas aventuras com o Saikyo, numa altura em que o tempo não esteja a correr em sprint, tal como a Lebre Branca em serviço de Sua Majestade a Rainha de Copas com medo de perder a cabeça se se atrasar!

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Kimono

Estar no Japão tem vindo a oscilar entre o muito positivo e o bastante negativo. Com calma as coisas vão seguindo lentamente o seu curso, e as saudades que apertam muitas vezes vão sendo apaziguadas com longas horas de conversa online, e com muitos emails de e para Portugal.
Para acalmar as saudades mantenho-me tão ocupada quanto possível - não é que precise de me esforçar muito, afinal de contas só as minhas aulas de Japonês com os seus, em média, três testes semanais, consegue deixar-me sem tempo para o quer que seja. Mas nem tudo pode ser trabalho, e vezes há em que arranjo um tempinho para fazer algo extraordinariamente especial. Experimentar coisas tradicionalmente Japonesas tem vindo a provar um dos melhores remédios para me ajudar a ver o lado positivo de aqui estar, e para acalmar as saudades...
Pois é, aqui há uns dias atrás, numa bela tarde de sábado, a minha amiga MM convidou-me e à minha amiga Mexicana M, para irmos ter com ela para uma aula muito especial. Ela anda a frequentar um curso para aprender a vestir o Kimono, o traje tradicional Japonês que tem tantas regras para ser usado, que ela vai ter de o frequentar durante três anos, duas vezes por mês. Existe uma grande variedade de Kimono, cuja tradução literal significa 'algo para usar'. Cada um tem a sua ocasião e estilo para ser usado. Meninas e senhoras usam Kimono de forma diferente de modo a mostrarem claramente o seu estado civil. Isto já para nem mencionar o sem número de acessórios e técnicas necessárias para conseguir vestir o Kimono. Podem bem duvidar, mas existem alguns tipos de kimono que uma pessoa a vestir-se sozinha simplesmente nunca poderia usar. Para quem quiser saber um pouquinho mais sobre esta vestimenta tradicional o site http://en.wikipedia.org/wiki/Kimono tem algumas informações muito úteis, ainda que esteja em Inglês (infelizmente a entrada na página escrita em Português é muito pobre, como se passa com tantas outras entradas).
Nesta tarde fomos levadas para um salão onde duas professoras de técnica de Kimono se encontravam a ensinar a jovens e a mulheres já maduras a arte de usar o traje. Enquanto a minha amiga tinha a sua aula (que foi dedicada a aprender como usar um Kimono formal que as mulheres casadas usam, sobretudo em casamentos), eu e a M fomos convidadas a experimentar um Furisode (que é um Kimono formal que as jovens solteiras usam, por exemplo num casamento, depois de entrarem na maioridade, aos 20 anos, e que se caracteriza particularmente pelas suas longas mangas, que indicam o estado civil da jovem). Depois de escolhidos os padrões para cada uma de nós, - o que foi complicado para a M, que por ser mais alta do que a média Japonesa quase que não tinha nenhum que lhe ficasse bem em altura, - começou o processo de nos vestir a rigor. Fui primeiro! E quando me dei conta, estava rodeada por três senhoras cada qual muito empenhada numa parte da vestimenta. Jamais alguma jovem consegue vestir este Kimono sozinha. Três senhoras experientes a vestir kimono e mesmo elas tiveram de se socorrer dos manuais algumas vezes, sobretudo quando se tratou do obi, que é a faixa de seda que aperta a zona abaixo do peito, e como podem constatar nas fotos que deixo abaixo, é mesmo muito trabalhado atrás. Uma das professoras, foi-nos dito depois, é uma especialista em arranjos de obi, sendo que viajou pelo mundo a ensinar como os arranjar, porque aparentemente tem a habilidade de transfomar o laço do obi em qualquer flor que deseje.
Demora imenso tempo a vestir um kimono, e durante esse tempo parecia que eu tinha sido transportado para outra era, para outra realidade. Uma era de rainhas e de aias, e senti-me estranha por tudo me estar a ser feito. A passividade é algo de difícil aceitação hoje em dia, mas nada se pode fazer quando existem tantos pormenores à frente, atrás e dos lados, e tudo tem de ficar perfeito.
O resultado foi de cortar a respiração. Quase não me reconheci. Dentro daquela seda lindíssima, cujo padrão somente já fascina. Claro que nunca poderia parecer nada mais nada menos do que uma estrangeira com uma 'pele' que não é a sua, mas foi interessante brincar a este 'faz de conta'. Senti-me numa história diferente da minha, senti-me outra por momentos, e isso fez-me pensar sobre quem eu sou, e quem gostaria de ser. É neste momento que, aqueles que me conhecem melhor, se perguntam, mas então onde está o teu lado feminista? Realmente ir a uma aula de Kimono, e depois tomar chá e bolos com as demais senhoras, vestindo belos Kimono, parece algo de muito tradicional e muito à mulher antiga. Mas a todos que se interrogam, a verdade é que a experiência foi fascinante, e afinal, ser feminista significa que eu posso fazer tudo quanto quero porque quero, e não porque a sociedade me obriga a isso, ou pelo menos é isso que significa para mim. Tive uma belíssima experiência tradicional, e conheci senhoras Japonesas muito interessantes, que resistiram à segunda guerra mundial e que têm histórias de vida mais fascinantes do que as de alguns livros de ficção.
Deixo-vos uma breve amostra da minha experiência. Sei que vou parecer um tanto estranha, mas por favor reparem no belíssimo kimono que estou a usar, porque é realmente belo, e ainda por cima tem duas das minhas cores preferidas. Simplesmente extraordinário.



Apenas um breve pensamento final,
"I, with a deeper instinct, choose a man who compels my strength, who makes enormous demands on me, who does not doubt my courage or my toughness, who does not believe me naïve or innocent, who has the courage to treat me like a woman." ~Anaïs Nin
(Eu, com o meu instinto mais profundo, escolho um homem que impulsiona as minhas forças, exige muito de mim, que não duvide da minha coragem ou da minha resistência, que não me tenha por ingénua ou inocente, que tenha a coragem de me tratar como uma mulher).
*A título de curiosidade: Anaís Nin é o nome porque ficou conhecida Angela Anaïs Juana Antolina Rosa Edelmira Nin y Culmell, uma autora cubano-francesa. No cinema existe um filme baseado na sua relação com Henry Miller, intitulado Henry and June, em que o papel de Nin coube à nossa grande Maria de Medeiros.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Fotos do Halloween

Uma breve missiva apenas. Acabo de receber algumas fotos que os meus colegas tiraram comigo no Halloween, comigo a fazer o cosplay de Haruhi. Todos nestas fotos vivem na mesma residência que eu. Fiz um pequeno clip, espero que gostem.
Na primeira estou sozinha, mas podem ver a minha fatiota (e perceber a razão do meu embaraço!!!). Na segunda, sou eu e o S, que é Americano, entretido com a DS. O E., Americano de pais Japoneses, que pareceu achar interessante puxar os lacinhos. Depois sou eu e a M., uma das pessoas com quem eu ando mais, sobretudo porque vivemos juntas, e estamos na mesma aula de Japonês, e que é Mexicana! Novamente com o S. que desta vez já está a 'olhar para o passarinho'. Eu e a D., que nasceu em Hong Kong mas que vive na América já há alguns anos. E finalmente, eu o S. e o E., que aproveitaram a minha altura para me usar como suporte (o que seria desnecessário se não tivessem bebido tanto :P - estou a brincar, ambos ainda tinham controlo sobre o equilíbrio!).
E pronto, espero que gostem!

domingo, 9 de novembro de 2008

Dar valor ao que se não tem...

Os meus fins-de-semana começam a proporcionar-me momentos óptimos de imersão na cultura tradicional Japonesa, e quase sem dar por isso sou levada tal como a Dorothy para um mundo mágico de tradições e rituais antigos que me condicionam e me fazem apaixonar cada vez mais por esta cultura tão distinta da minha. Uma cultura de contrastes e de oxímoros quotidianos, mas que de vez em quando se transforma em sonho em vez de pesadelo, e que me leva, de olhinhos a brilhar, a ver algo diferente e a descobrir coisas novas, enquanto me redescubro a mim mesma.
Este foi um fim-de-semana extremamente rico. Sim, é verdade que ainda estou no Domingo, mas acho que o mais surpreendente já merece ser aqui reportado.
Tudo aconteceu na sexta-feira (7 de Nov., 2008). Há cerca de três semanas atrás, na aula de Japonês foi-nos dada a possibilidade de assistir a uma peça de Kabuki (Teatro Tradicional Japonês reconhecido pelas suas histórias retorcidas, pelo uso de maquilhagem e guarda-roupas fantásticos, assim como por ser apresentado por troupes de homens somente - para quem quiser saber mais: http://pt.wikipedia.org/wiki/Kabuki), por uma quantia de cerca de um quarto do preço original. Foi uma oportunidade a não perder. O espectáculo era em Heisei-Nakamuraza, o teatro da família Nakamura, uma das troupes mais conhecidas do Japão, situado na bela e tradicional Asakusa, com o seu grande templo Shinto. Foi em grande expectativa que subi os degraus para o segundo andar do teatro, e me sentei no meu lugar, directamente por cima do palco (ou seja, atrás das cortinas!). Foi a melhor coisa que podia ter acontecido! A vista da peça foi óptima e ainda pude ficar a saber como se processam as coisas ao nível do backstage (mudanças de cenário, maquilhagem e trocas de roupa em palco, substituições e saídas dos actores...), enfim, todos aqueles pormenores extra que só enriqueceram a minha experiência no Kabuki. Vi uma peça famosa no Japão, normalmente intitulada por Hokaibo (Sumidagawa Gonichi No Omokage - para saber mais: http://www.lincolncenter.org/load_screen.asp?screen=Hokaibo, em Inglês). Sem ter levado o meu suporte auditivo em Inglês, assisti à peça como quem assiste a uma peça de bailado, e pelo movimento e dramatização consegui perceber tudo aquilo que procuravam transmitir (ainda que tenha perdido muitas das fontes verbais do cómico!). Foi algo de único, mágico mesmo. Conseguem de certo imaginar, eu, lá sentada, com os olhinhos a brilhar, sobretudo quando: a personagem principal, o líder da troupe (Nakamura Kanzaburo, na imagem), aparece mesmo por trás de mim, para entrar na cena seguinte. Não há palavras! Nunca vou esquecer esta minha experiência no Kabuki, e desde agora sou fã desta arte (ainda que tenha tenha reservas sobre as mulheres serem proibidas de fazer parte deste espectáculo). No final da peça, depois de vários minutos a aplaudir de pé, e das cortinas terem sido abertas três vezes, finalmente acordámos do sonho, e 'voltámos ao Kansas', não sei se com mais coragem, mas certamente com um cérebro e um coração mais ricos. É certamente uma experiência que tenho de repetir. Foi algo de fascinante para mim.


Mas porque será que só damos valor ao que perdemos, ou ao que não é nosso? É cada vez mais verdade que "A galinha da vizinha é sempre melhor do que a minha!", e isso foi óbvio para mim ontem (Sábado). Fui encontrar-me com a minha amiga MM, de quem já falei e com a sua mãe, (para uma experiência alucinante que marcou este fim-de-semana, mas sobre a qual reflectirei noutra oportunidade) e contei-lhes a fantástica experiência que tivera no Kabuki no dia anterior. Elas ficaram muito contentes por ouvir tudo, mas confessaram nunca ter ido assistir a Kabuki, nem conhecer a peça que eu tinha ido ver. Reflectindo sobre isso, lamentei o facto de não darmos o devido valor às coisas maravilhosas que temos. Os Lusitanos não podiam ser melhor exemplo disso mesmo. Aproveitemos para pensar...Quantos de nós leram a 'Bíblia Nacional' que são os Lusíadas e que tanto dizem do nosso povo, da nossa história e dos nossos costumes? Quantos de nós preferem viajar dentro do país a ir passar férias fora? Entristece-me ver que muitos de nós não apreciam realmente as coisas belas que tomamos como certas. Quantos de nós já frequentaram uma casa de fados? Eu ainda não, mas sinto-me cada vez mais impelida a fazê-lo, afinal, estou sempre em contacto com pessoas de outras culturas, sou como uma 'emissária cultural' da minha cultura, e sinto a necessidade de ser capaz de a dar a conhecer aos demais. Mas será que mais pessoas pensam como eu?
Sou Gaikokujin, uma estrangeira aqui, e olho para tudo com a admiração e o interesse de alguém de fora que quer descobrir tudo ao máximo. Espero continuar a desenvolver-me no sentido de um dia, poder alcançar um estado que me faça olhar para tudo com a objectividade e com a curiosidade de quem vê de dentro para fora...tal como Eduardo Lourenço, esse nome tão ilustre da nossa sociedade, espero viver nas margens com mais intensidade do que quem vive no centro.
Tudo tem alguma beleza, mas nem todos são capazes de ver. (Confúcio)
Um pequeno post-scriptum: Ao sair do meu lugar e a dirigir-me para as escadas do teatro reparei que havia grande movimentação junto dos lugares VIP, e qual não foi o meu espanto ao saber que, nem mais nem menos do que Hayao Miyazaki (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hayao_miyazaki), uma lenda viva do Anime, e figura ilustre da sociedade Japonesa contemporânea, estava ali, a alguns metros de onde me encontrava! Foi um encerro com chave de ouro!

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Banho de cultura ao Domingo

Há pouco mais de um século atrás a elite cultural portuguesa procurava ir a Paris todos os anos para o seu banho de cultura anual. Pois bem, os tempos mudam, e os banhos de cultura já não são como eram. Eu experimentei o meu próprio 'banho de cultura' aqui no Japão.

Depois da quadra de Halloween, que quer se queira quer não, é mesmo para a paródia, fui convidada para almoçar no Domingo (dia 2). O convite veio da Professora Mita, uma professora do Departamento de Português, que se encontra em sabática este ano, e que eu ainda não conhecia. A professora convidou-me a comparecer no Domingo, no Takashimaya Times Square (um dos centros comerciais mais VIP de Shinjuku, mesmo no coração de Tóquio. Claro que o estatuto VIP paga-se, e as lojas são de Boss e que tais para cima!). Fiquei entusiasmada com a oportunidade de conhecer este novo local, e de poder apreciar a dinâmica de circulação de pessoas por lá. Para além de mim, mais três alunos foram também convidados, dois Japoneses que se encontram a escrever as dissertações de Mestrado, e uma Brasileira de ascendência Japonesa que se encontra cá em Doutoramento.



Exactamente às 13h em ponto eu encontrava-me em frente do restaurante, onde já se encontrava tanbém uma das outras convidadas, a aluna de Mestrado Japonesa. Até lá chegar fui observando a circulação de pessoas. Mesmo num sítio tão caro foi impressionante a diversidade de pessoas que lá se encontrava, podendo mesmo notar-se uma grande diversidade de condições socio-económicas, sobretudo nas áreas de restauração. É bom explicar o porquê da escolha do sítio para este almoço: o Takashimaya tem 14 andares, e a zona de restauração ocupa os dois últimos, sobretudo. As vistas dos restaurantes, não é de admirar, são verdadeiras panorâmicas sobre a cidade. Penso que será um dos motivos que atrairá tanta gente a este local, ainda que fuja um pouco às bolsas, até para a classe média.



O almoço decorreu agradavelmente, sempre com conversas a tocarem temas interessantes, nomeadamente envolvendo relações culturais e linguísticas entre o Brasil, o Japão e Portugal. Debateu-se muito sobre o ensino e a aprendizagem. Debateu-se sobre questões de imigração, enfim, foi um 'banho de cultura' para todos nós, sobretudo porque todos provindo de culturas e experiências pessoais distintas, pudemos aprender todos uns com os outros, particularmente com a Professora Mita, que muito mais experiência de vida tem do que nós.



Uma pequena nuvem cinzenta tolda as minhas memórias deste almoço, pelo que me senti na obrigação de me desculpar perante os demais participantes, em particular com a Professora Mita que tão gentilmente me convidou. O restaurante era um típico restaurante Japonês, de Sashimi. Para os que pouco conhecem da gastronomia Japonesa, o Sushi descreve o comer de peixe cru com arroz, sendo que o foco é o arroz, enquanto que o Sashimi, descreve também a mesma experiência, desta vez concentrando-se no peixe cru. A grande diferença é que: enquanto no sushi existem pratos, como o makisushi ou makizushi, que engloba o peixe cru enrolado em arroz e com alga por fora, no sashimi, as postas de peixe cru vêm separadas do arroz, sendo comidas depois de molhadas em molho de soja com outras ervas aromáticas. Infelizmente, o meu paladar pouco habituado a peixe cru fez das suas, e apesar das caras deliciadas de todos os demais participantes, foi com algum esforço que eu comi a maior parte da comida que me foi servida. Desculpei-me, evidentemente, e expliquei que a adaptação a estes paladares ainda não se completou para mim, ainda que já consiga tolerar e até apreciar alguns tipos de makizushi (em particular o de salmão, que é realmente o meu preferido). Todos concordaram que era algo de difícil habituação. Espero que não tenham levado muito a mal esta minha 'deficiência' gastronómica. Contudo, durante as minhas aulas esta semana, com Japoneses, este assunto foi abordado e fiquei a saber que muitos são os Japoneses que também não apreciam sashimi. De repente senti-me muito mais leve!



O almoço esse, voltando ao assunto desta pequena reflexão quotidiana, prolongou-se depois com um café num bar acolhedor até cerca das 17.30h. Foi um dia muitíssimo interessante para mim, e penso que para os demais também. Foi óptimo conhecer pessoas novas e interessantes, e sobretudo ter a oportunidade de conviver com pessoas de forma algo diferente daquela que experimento diariamente, nas aulas, na residência, ou nas saídas com o pessoal. Espero ter mais alguns banhos de cultura por cá, quem sabe em breve...

domingo, 2 de novembro de 2008

Halloween

Halloween, a Noite das Bruxas, já chegou e já passou. Viver esta data aqui deste lado revelou-se uma mistura de experiências que eu não pensava alguma vez passar. Para começar porque vive a quadra de duas maneiras completamente distintas, e depois para ajudar ainda mais à confusão, decidi fazer uma coisa que nunca tinha feito, e que apesar de engraçada, foi bastante constrangedora.
Comecemos pelo princípio. O princípio da minha entrada na quadra de Halloween foi no Sábado, dia 25 de Outubro – sim, eu sei, parece muito cedo, mas se pensarem no auge do consumismo que é Tóquio, a promoção da quadra começou mais ou menos quando eu aqui cheguei, em Setembro. Mesmo não sendo uma tradição muito antiga aqui no Japão, o Halloween reune cada vez mais adeptos, e as lojas e comércio em geral aproveitam qualquer desculpa para promover o negócio, então é a loucura: desde bolos enfeitados ao espírito da época, até doces criados de propósito, até chegarmos ao auge: os fatos de cosplay (Cosplay significa vestir-se como uma personagem de anime, é algo muito popular entre os amantes do género em todo o mundo! Sobretudo aqui!).
Pois foi, no dia 25, eu e os meus dois amigos Mexicanos, fomos até Umegaoka, uma localidade dentro de Tóquio, muito bonita e acolhedora. Lá vive a minha amiga MM, cuja mãe é professora de Inglês e estava a organizar uma festa de Halloween para crianças. Eu e os outros dois fomos convidados a participar na festa. Foi uma loucura! Desde o meio-dia até às cinco da tarde estivemos os três espalhados na saída da estação de comboio local de Umegaoka, onde estavam montadas várias mesas e postos de actividades para crianças, relativas à época. Foi alucinante a quantidade de crianças, acompanhas pelos pais, avós e restantes familiares, vestidos a rigor, a fazer fila para participarem em todas as actividades disponíveis. A actividade em que eu estive envolvida consistia em cada criança tirar um cartão com uma imagem (ex. Um rato, um dedo, miolos...), e depois procurar o objecto correspondente num caldeirão de bruxa cheio de uma pasta gelatinosa e esbranquiçada, perante a qual várias crianças começaram a chorar. Nunca tinha interagido tanto com crianças Japonesas, e a experiência foi fantástica, ainda que no final estivessemos mesmo muito cansados! A actividade seguinte foi ainda mais surpreendente: houve dois jogos de Bingo, para que a população ganhasse prémios, e em cima do palco quem melhor do que nós os três e dois outros senhores mascarados de vampiros para dar os prémios? Quem diria que eu viria para o Japão, e estaria em cima de um palco a tirar os números do Bingo? De loucos. A noite encerrou com chave de ouro com um jantar no melhor restaurante Japonês onde já comi por cá, um dedicado a Tenpura (que é uma derivação do termo ‘tempêro’ em português, mas que na realidade não se parece com nada que eu conheça na cozinha portuguesa!) e que nos deliciou a todos. Estou extremamente grata à MM, e à mãe dela que foi realmente uma senhora muito simpática e divertida.
Depois desta experiência, a segunda vivência que tive do Halloween foi um pouco mais constrangedora...Já há algum tempo que eu pensava experimentar Cosplay. Então, que melhor altura para o fazer que no Halloween? Decidi-me, e passei a tarde de ontem em Akihabara a procurar o fato de Cosplay que usaria. Depois de muito procurar encontrei: Haruhi Suzumiya! Achei o fato engraçado, e decidi-me. O pior foi depois de o vestir! Primeiro porque estava sozinha e depois porque vestida dessa forma, sendo estrangeira, a verdade é que os muitos olhares surpresos das pessoas à minha volta foram bastante intimidantes. Fiquei espantada. Depois de um sábado numa ‘pequena localidade’ em que todos estavam mascarados e festejar o Halloween uma semana antes, ontem quase não se via ninguém mascarado. Senti-me uma ave rara, e por isso mesmo, muito envergonhada. Depois de me juntar ao pessoal, mesmo tendo de aturar as suas muitas piadas a propósito da minha fatiota, comecei a sentir-me melhor. Fomos até Yoyogi, onde existe um parque onde estivemos a comer, beber e conversar até mais ou menos às onze. Depois demos a noite por encerrada, isto porque não queríamos perder o último comboio e porque chegar a casa ainda demorava mais uma hora!
Happy Halloween (ainda que um pouco atrasadito!)