sábado, 28 de fevereiro de 2009

Épocas de festas...


Cá estou eu de novo, para voltar a falar de assuntos passados porque na altura se tornou impossível falar neles. Desta vez vou contar em pormenor como foi a minha época de festas por estes lados.
Dezembro é uma altura de muitas festas para mim. Começa com o meu aniversário, passam uns dias e vem o Natal, e depois tudo culmina na Passagem de Ano, com um novo recomeço de vida, ou seja o retorno à mesma rotina, ou a decisão de mudar de vida para o novo ano (se bem que estas resoluções nem sempre acabem por se concretizar...).

Desta vez, Dezembro foi diferente. Era o mesmo mês, o calendário marcava a passagem dos dias da mesma forma, mas a verdade é que algo não parecia igual. O meu aniversário decorreu de forma pacata como já expliquei. No vídeo abaixo podem encontrar um pequeno clip de fotografias do jantar com o clube de Shorinji Kempo, e da minha micro festa com os amigos que fui conhecendo por cá. Infelizmente a altura não foi das melhores, muitos trabalhos e um tempo gélido e de chuva, por isso no total fomos apenas 5 a reunirmo-nos na Universidade, mas posso garantir que apesar de poucos, foi uma óptima celebração. Mas o melhor de tudo, foi mesmo a festa que tive em directo de Portugal, na madrugada de Sábado (13) para Domingo (14), com os meus familiares e melhores amigos reunidos na minha casa. Nunca esquecerei como foi importante falar e conviver com todas estas pessoas tão próximas ainda que à distância de um clique e de uma webcam. Muito obrigada a todos por me ajudarem a festejar o facto de estar a ficar um bocadinho mais velha (e, esperemos, mais madura e crescidinha - ainda que sempre com uma forte resolução de manter o meu síndrome de Peter Pan!).

Um pequeno passar de umas luas, e chegou a vez de celebrar o Natal. Em Portugal e pelo ocidente discute-se o crescente consumismo e a forma como o significado religioso se perde nesse mar de prendas para comprar e oferecer, no dinheiro que falta sempre, na comida que nunca chega, nos familiares que vêm sempre ou que nunca vêm...Enfim, é sempre o mesmo stress, sempre as mesmas confusões, mas por todo o lado cheira a Natal, e parece que o espírito da época, o zeitgeist (perdoem-me os erros mas alemão realmente nunca estudei!) natalício enche tudo. Ou pelo menos é isso que se passa comigo. Mas não neste ano. O Japão vibra em acorde dissonante nesta época do ano. Fora os muitos católicos e cristãos que por aqui se encontram, ou que daqui são, os restantes Japoneses vêem o Natal como um Dia de São Valentim. Uma data a comemorar com a cara-metade, de preferência na Disneyland ou na Disneysea (para quem já não consegue entrar na primeira, ou porque esta tem fama de ser para casais!), com uma boa dose de romantismo, e até, há quem diga, uma noite passada entre lingeries e comidas afrodisíacas em que não dispensam muito chocolate à mistura. Conseguem perceber o meu choque! Da primeira vez que disse que o Natal era uma data especial para passar com a família, e que na Passagem de Ano se juntavam os amigos em festas de animadas, os Japoneses à minha volta olharam-me como que para uma espécie de outro planeta, e eu interroguei-me sobre o porquê da sua reacção. Depois é que me explicaram: por estes lados passa-se exactamente o contrário: o Natal é para a alma-gémea, e a Passagem de Ano é a data a passar com a família, na terra natal e em perfeita serenidade e solenidade. Agora já sei como se sentiu a Alice no Outro Lado do Espelho, parece igual, mas nada o é mesmo!
E que fazer então numa data que aqui quase não significa nada do que normalmente deveria significar? Bem, vai-se passear com os amigos internacionais, cada qual com o seu credo e tenta-se passar um dia mais ou menos na companhia de quem nos é mais ou menos próximo. O nosso passeio foi até Ikebukuro, onde se encontra um centro comercial gigante que inclui um aquário e um planetário nos pisos de cima. Depois de um almoço num restaurante italiano fomos para o Sunshine City, e começámos a procurar o aquário. Depois de algumas voltas lá chegámos e decidimos que o planetário seria melhor. O espectáculo foi substancialmente diferente do que eu esperava, mas no fim, três de nós sentiram-se orgulhosos por terem conseguido perceber mesmo sem um nível elevado de Japonês e dois de nós sentiram que tinham tirado uma boa sesta durante o espectáculo! No final concluímos que se calhar o aquário teria sido mais interessante, pelo menos poderíamos ter visto o show dos pinguins e das focas.

Saímos e fomos tomar uma bebida quente a um café muito VIP que ficava a caminho da estação, para seguirmos para a missa de Natal especial (porque a meia-noite foi trocada pelas 19h), organizada na Universidade. O café era interessante, o preço é que não foi assim tão agradável, mas enfim, era Natal! Em baixo poderão encontrar uma foto lá tirada. Acabámos por chegar atrasados à missa, comigo já em brasa porque o pessoal parecia não estar minimamente preocupado, e ainda tivemos de esperar cerca de 30 minutos numa fila para poder entrar no auditório onde já se encontrava a decorrer a missa. Aparentemente a hora era para cumprir mesmo não havendo tempo de sentar todas as centenas de pessoas que pretendiam assistir ao serviço religioso, que decorreu, em Japonês (foi interessante, o ritual é tão padronizado que nem com a diferença da língua uma pessoa deixa de perceber exactamente o que está acontecer) . Interessante de ver foi o edifício de entrada na Universidade em que, com as luzes de algumas janelas acesas, se desenhava uma cruz. Depois acabámos a noite no apartamento do J. (que acaba de voltar para França - bonne chance!) a jantar sushi e massa chinesa! Claro que foi engraçado, mas não foi realmente Natal. Natal, tive um bocadinho depois de chegar a casa, com os meus pais, através da internet. Sim porque, apesar da distância, estive presente na ceia de Natal e na abertura das prendas!

Mais alguns dias passaram e chegou o dia 28 de Dezembro de 2008, o dia da partida para Kanazawa, para ir passar a Passagem de Ano a casa da família de uma das minhas amigas que esteve por aí por Portugal aqui há uns tempinhos. Dada a quadra festiva ela partiu antes de mim e eu estava confiante que não teria qualquer problema na viagem uma vez que já a tinha feito com ela uma vez. A viagem normal demora cerca de 4 horas de shinkansen (o comboio rápido), e inclui uma mudança mais ou menos ao fim da primeira hora. Nesse dia tudo foi diferente, mas essa, como dizia Michael Ende, é uma outra história, e será contada noutra altura. Mas enfim, lá cheguei ao meu destino bem gelado, mas sem estar coberto de neve. Pelo caminho, mesmo estando com uma disposição que não deu para apreciar convenientemente as coisas, pude ver zonas de planície cobertas de neve. Cenários vestidos de branco, com as montanhas e as árvores todas cobertas de neve, cortadas apenas pelos rios que corriam a atravessá-las. Como gostava de ter podido apreciar tudo isto de uma outra forma.

Os dias que passei em Kanazawa foram uma mistura de alegrias, mas com um fundo de tristeza porque as saudades de casa fizeram sentir-se bastante. Fiz vários passeios com a minha amiga pela cidade. Visitei o Castelo, Kanazawajoo, que é uma reconstrução do antigo que lá existiu, feita há menos de meio-século. Visitei-o por dentro e pude admirar a construção tipicamente Japonesa em madeira - em que nenhum ferro é usado (nem pregos, parafusos ou outros - a madeira tem cortes que fazem encaixar cada peça noutra, e assim se vai montando um puzzle sólido e robusto, sem juntas). A vista do cimo do castelo era muito bonita e de um dos lados vê-se o mais importante parque da cidade, e um dos três parques mais famosos do Japão, o Kenrokuen. Dito no nome, este parque inclui as seis (roku) características consideradas como as mais belas num jardim (segundo a tradição zen, se não estou em erro), entre as quais se contam as pequenas dimensões, e o facto de ter muita diversidade de espécies e de espaços. O parque é lindíssimo, com um magnífico lago; inclui casas de chá junto a pequenas quedas de água, e uma estátua imponente do (segundo reza a lenda) primeiro homem a habitar o Japão. Apesar do frio gélido, a neve não cobriu o parque durante a minha visita, e se bem que nevou quando o estava a visitar, não foi o suficiente para se acumular nas cordas que protegiam as árvores (e que se podem ver nas fotografias no clip abaixo). Tivemos ainda a oportunidade de fazer uma visita guiada ao Ninja Dera, ou pelo menos é assim que é conhecido o chamado Templo Ninja. Na verdade nada neste templo teve ligação com os clãs ninja, era simplesmente o templo em que o governador da cidade rezava, mas dadas as medidas extremas de segurança que inclui, ficou conhecido como tal. Em três andares o edifício conta interiormente com 7 camadas de divisões, isto porque por fora nenhum edifício podia ser mais alto do que três andares. Escadarias, entre as visíveis e as escondidas, contam-se cerca de 37, e segundo a lenda, existe um túnel que liga um poço interior ao Castelo da cidade (que fica ainda a uns bons quilómetros de distância). Escusado será dizer que adorei a visita!!!Ninjas, mistério, lendas antigas e toda aquela aura de secretismo deixou-me completamente entusiasmada, e por momentos lembrei-me de como ficara fascinada em pequena ao saber que o sítio da Vista Alegre tinha algumas lendas a ele associadas.

O dia 31 de Dezembro chegou, mas por estes lados tudo gira em torno da manhã do dia 1, e por isso, na noite da Passagem, eu, a minha amiga e a sua mãe fomos assistir a um concerto de música clássica - o kountodaun consaato, ou Count Down Concert. Foi muitíssimo interessante, tinham inclusivamente artistas convidados, estrangeiros e nacionais (tenores, violinistas, pianistas) e enfim, todo o repertório foi fantástico. No meio do espectáculo houve tempo para um jantar, que estava incluído no preço do bilhete (das ofertas - sushi, crepes doces, soba noodles ou sandwiches - podia escolher-se uma, mas o bar era aberto, assim como os "barris" de sake). Voltámos a entrar eram 23.40h, e alguns momentos antes da meia-noite entraram em palco todos os 10 convidados da festa, cada um com uma placa com um número. À medida que se fazia a contagem, o convidado baixava a placa, e no final apresentaram-nas viradas ao contrário, onde se podia ler omedetou gozaimasu (Muitas Felicidades, ou neste caso, Feliz Ano Novo, ainda que a expressão na manhã do dia 1 deva ser kotoshi omedetou gozaimasu). No regresso a casa, perto da uma da manhã a minha amiga ainda quis passar num templo para rezar pelo Ano Novo. Aparentemente a família dela costuma fazer mais do que uma visita, e escolhe o templo de acordo com o propósito do pedido. O templo em que parámos era especificamente para sorte nos estudos, isto porque ela se encontrava em véspera de ter exames de fim de curso. Infelizmente, ao vento e à chuva, naquela hora da manhã, centenas de pessoas faziam fila no templo para rezar, e por isso a visita foi adiada para o dia seguinte, sendo que o pai dela também foi, e aproveitaram para trocar a seta do altar de casa por uma com a placa do novo ano, o Ano da Vaca/Boi (Ushi designa ambos uma vez que as palavras não têm género, mas a tradução em Inglês é Ox, que corresponde ao masculino, ainda que os desenhos que vi em símbolos e cartões alusivos representasse o que me pareceu uma Vaca! Enfim, alguma confusão neste aspecto).

O dia 1 começou pelas 10 da manhã com um pequeno-almoço ao estilo brunch, como poderão ver nas fotografias, com muitas comidas deliciosas (cada qual com um significado de boa sorte e prosperidade para o ano) servidas no tradicional serviço de fibra preta e vermelha com acabamentos em kin paku (pelo que, segundo a minha amiga me explicou, a caixinha preta que podem ver custou, há 24 anos atrás, mais de 1000 euros, e foi a prenda de casamento dos pais da noiva). Não faltou o tradicional sake também ele com folha dourada dentro, servida nas tacinhas vermelhas. Era tradição por isso também provei, mas acho que não cheguei a engolir or pequenos flocos de ouro para me dar sorte. Depois destas comidinhas, e de já estarmos bem cheios, fomos visitar a família do lado paterno da minha amiga. Aí foi-nos servido novamente um almoço, desta vez muito tradicional, com sashimi (para minha grande preocupação - ainda bem que tinha comido antes! Claro que apresentei as minhas desculpas, e todos pareceram compreender). O sake foi sendo constantemente servido e a tarde foi passada em muitas conversas diferentes. Finalmente, ao cair da noite voltámos para casa, para um serão pacato, depois da visita ao templo.
No dia 2, o meu último dia completo lá, uma vez que regressei no dia 3 no autocarro nocturno, fomos jantar a casa da família do lado materno. Uma fotografia de todos os presentes pode ser vista no clip (faltava apenas a mãe da minha amiga porque, sendo enfermeira, só chegou quase no final do jantar). Nesse dia, de manhã, fomos com o pai da minha amiga visitar a parte antiga da cidade. Ruas de casas ao estilo tradicional fizeram lembrar os filmes que mostram os tempos de Japão feudal. Quase todas estas casas era salões de chá antigamente, agora foram convertidas em lojas de lembranças da cidade, em que a folha dourada marca presença, desde cartões até bolos cobertos com ela. De tarde, fomos as duas, visitar o museu de Arte do Séc. XXI recentemente aberto, e a experiência fez-me lembrar Serralves. As exposições contavam com trabalhos de artistas nacionais e internacionais e de todos eles o que dá mais que falar é a piscina que podem ver na fotografia. Trata-se de uma sala com um tecto formado por dois vidros, no meio do qual se encontra água, mais ou menos 10 cm de altura, mas quem vê por cima parece uma piscina cheia de água - o artista, se não estou em erro é Sul Americano, mas agora não consigo precisar. O jantar começou por volta das 17h, e foi com uma barriga a dar horas que todos nos sentámos a apreciar as belíssimas travessas que foram postas na mesa. No final do banquete a sobremesa foi europeia, com os nossos tradicionais Natas do Céu e Bilharacos, feitos por mim, e com gelados HaggenDasz. Foi um serão fantástico, só tive pena de não conseguir falar mais Japonês, mas mesmo compreender era difícil dado que em Kanazawa se fala com um sotaque diferente do padrão. Antes de nos virmos embora ainda jogámos um jogo tradicional Japonês, em que uma pessoa de olhos vendados tenta construir um rosto colocando nos locais a que pertences os olhos, boca, nariz, orelhas e sobrancelhas. Na foto quem está a jogar é a minha amiga, mas quer eu, quer o primo dela de 9 anos também tivemos a nossa chance, e no final, até posso dizer que não me correu assim tão mal.

O dia da partida foi passado fora de casa, pela zona de lojas da cidade. Acompanhadas do primo da minha amiga que queria gastar o seu dinheiro da Passagem de Ano (é tradição que os mais novos recebam dinheiro de todas as pessoas da família - agora já percebem porque é que é bom ter famílias pequenas aqui por estes lados!!!), fomos vendo as lojas, e ainda acabámos por comprar alguns doces.
Por volta das 22h chegou o momento de dizer adeus, e até uma outra oportunidade. Eu e a minha amiga apanhámos o autocarro que, durante toda a noite, nos trouxe de volta a Tóquio. Chegámos por volta das 7 da manhã, cansadas e com o pensamento já nas aulas que começariam novamente no dia depois do seguinte. E assim terminou a época das festas de fim de ano. Espero que tenha sido interessante ler o que acabo de escrever, ainda que só possa garantir que não vos transmitem nem uma ínfima parte de tudo o que vivi, experimentei e passei aqui por estes lados, mas contra isso nada mais posso fazer.


1 comentário:

Lia disse...

Oi! Ler um post teu é uma aventura...Gostei de saber novidades. Vai ao meu k tem muitas tb. beijo